Por Felipe Teles*
O momento é instável e preocupante tanto para os hospitais, quanto dentro dos lares brasileiros. A contaminação por coronavírus causa diversos sintomas (muitos ainda desconhecidos) como febre, cansaço e dificuldade para respirar. Porém, uma outra enfermidade está ganhando espaço no ambiente, se fortalecendo através de mutações e pela falta de diagnóstico e tratamento. Em menos de cinco anos o câncer será a doença com a maior taxa de letalidade. E, ao contrário do coronavírus, em quase 100% dos casos oncológicos o início da síndrome não desperta nenhum sintoma.
No status pré-pandemia, diversas pesquisas apontavam para um aumento exponencial de mortes provocadas por algum tipo de câncer. Após o surto e com as medidas assistenciais restritivas apenas para casos em que o paciente apresenta alterações que podem ser virais, as organizações de Saúde têm registrado uma queda preocupante no número de pessoas com diagnóstico para câncer. Pior: muitos pacientes oncológicos interromperam o tratamento por medo da contaminação pelo coronavírus. Em todo o País, 70% das intervenções cirúrgicas para tratamento oncológico foram adiadas.
Mutação
O câncer se manifesta por meio de uma mutação genética no DNA da célula, que passa a receber informações incorretas que interferem nas atividades celulares. Pois bem, esse processo oncológico se assemelha ao momento proporcionado pela pandemia da Covid-19. Os pacientes com câncer estão recebendo informações erradas (quando as recebem) o que faz com que abandonem o tratamento, os hábitos de prevenção e, principalmente, o diagnóstico. Enquanto o coronavírus está fazendo milhares de pessoas chorarem a perda de entes próximos, o câncer se alastra nas estruturas fisiológicas sobrecarregadas pela depressão por conta do distanciamento social, o medo da contaminação e o abandono de atividades físicas, por exemplo.
Compreensão
Para quem não está imerso na medicina e na prática da Saúde rotineiramente, o cenário descrito pode parecer pandêmico e catastrófico. Contudo, ainda resta tempo para transformar a forma como as pessoas lidam com o câncer – principalmente aquelas que sequer foram diagnosticadas. É necessário compreender os pacientes oncológicos pelo abandono do tratamento frente à pandemia do coronavírus. São pessoas que, em parte, estão em um processo de distanciamento social, fragilidade imunológica e emocional. Pessoas que convivem por meses ou anos com o temor de não poderem estar ao lado dos seus familiares a qualquer momento.
Ainda assim, os médicos e profissionais da assistência devem insistir em aconselhar e bem informar os pacientes sobre a importância da prevenção contra o câncer. Em meio à crise do coronavírus não podemos nos distanciar da preocupação com as demais enfermidades. A obesidade provocada pelo sedentarismo do home office, o aumento do consumo de bebidas alcoólicas, o hábito do tabagismo como fuga da ansiedade e diversos outros fatores estão contribuindo para que o câncer avance em sua taxa de óbitos. E isso em menos de cinco anos.
A prevenção é o melhor caminho para evitar o coronavírus, o câncer e tantas outras enfermidades que fazem da Saúde um setor voltado para cura e tratamento. Uma Saúde humanizada significa prevenção e bem estar.
*Felipe Teles é radioncologista, com MBA em gestão hospitalar e membro da Sociedade Brasileira de Radioterapia.